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terça-feira, 3 de julho de 2007

Construção Sustentável

A idéia de desenvolvimento sustentável começou a se difundir à medida que crescia a consciência sobre o esgotamento dos recursos naturais.As muitas frentes de discussão sobre o assunto enveredam por aspectos econômicos, sociais e ambientais, tais como a busca por formas alternativas de energia em substituição ao petróleo, manejo de florestas para evitar sua extinção ou o exercício de uma arquitetura sustentável.

Uma conceituação atual e abrangente de arquitetura sustentável é dada pela arquiteta Roberta Kronka Mülfarth, do Labaut-Laboratório do Departamento de Tecnologia da FAU-USP e professora da disciplina conforto ambiental na Faculdade de Arquitetura da Uniban:“É uma forma de promover a busca pela igualdade social, valorização dos aspectos culturais, maior eficiência econômica e menor impacto ambiental nas soluções adotadas nas fases de projeto, construção, utilização, reutilização e reciclagem da edificação, visando a distribuição eqüitativa da matéria-prima e garantindo a competitividade do homem e das cidades”, diz Roberta, que defendeu tese de doutorado sobre arquitetura sustentável.

Segundo o arquiteto e professor Ualfrido Del Carlo, pesquisador do Nutau-Núcleo de Pesquisa em Tecnologia da Arquitetura e Urbanismo da USP e ex-diretor (hoje aposentado) da FAU-USP, os conceitos de sustentabilidade podem ser aplicados tanto em edificações novas como em retrofits.

“É apenas uma questão de consciência, pois é perfeitamente possível substituir sistemas construtivos e materiais de acabamento não recicláveis ou causadores de grande impacto ambiental por outros, que não comprometam o meio ambiente nem a saúde do ser humano que trabalhará na obra ou usará a edificação”, afirma.

De acordo com o professor, a lista de materiais substituíveis é bastante extensa e inclui produtos como cimento, concreto, derivados de petróleo, tintas e vernizes insolúveis em água ou com grande concentração de metal, para citar apenas alguns exemplos. Dependendo do porte da obra, ele sugere o uso de adobe e madeira de reflorestamento ou de áreas manejadas.

“Aço e vidro, embora tenham muita energia incorporada [energia usada na fabricação do material], têm seu uso justificado pela possibilidade de reciclagem”, complementa a arquiteta Joana Gonçalves, professora do Departamento de Tecnologia da Arquitetura da FAU-USP. Sua colega, a arquiteta Daniela Corcuera, que prepara o livro Edifícios de escritórios - O conceito de sustentabilidade nos sistemas de vedação externa, concorda. “A produção de alumínio, por exemplo, requer 126 vezes mais energia que a de madeira. Porém, quando se trata de um produto 100% de alumínio, a reciclagem é possível, o que diminui o impacto causado.

O problema maior é quando ela não acontece, como no caso dos painéis compostos de alumínio (ACM), que agregam chapas do material a outros elementos. A separação consome tanta energia e tem custo tão elevado que a reciclagem se torna financeiramente inviável”, detalha. Para Daniela, uma das atribuições do arquiteto é cobrar dos fornecedores informações sobre cada material, para saber quanta energia ele requer para sua produção, se é reciclável, quanto gasta de energia para reciclar e qual é o comportamento em termos de conforto ambiental. “A UIA - União Internacional de Arquitetos e o AIA - American Institute of Architects (EUA) adotaram no início da década de 1990 a Declaração de Interdependência para um Futuro Sustentável, documento que coloca a sustentabilidade social e ambiental como ponto central da responsabilidade profissional dos arquitetos”, ela afirma.

De acordo com Joana e Roberta, boa parte dos conceitos da arquitetura sustentável está presente nas aulas básicas de conforto ambiental, que ensinam a considerar aspectos como insolação, ventos dominantes, características do entorno e uso dado à edificação antes de definir posicionamento no lote, espessura das paredes, dimensão das aberturas ou materiais que serão empregados. “O objetivo é explorar as formas passivas de energia até a exaustão antes de partir para as soluções de energia ativa”, completa Daniela. Um dos pontos destacados por Joana é a necessidade de dar mais atenção ao desenvolvimento das fachadas. “É comum prédios com grandes superfícies de vidro onde as luzes permanecem acesas durante o dia inteiro”, exemplifica.

O ideal, segundo ela, é procurar reduzir as áreas de transparência para diminuir a entrada de calor. Ao mesmo tempo, o aproveitamento da iluminação natural deve ser maximizado. As janelas altas, junto ao teto, ajudam a distribuir melhor a luz - o resultado é ainda melhor quando as superfícies internas apresentam cores claras para difundir a luminosidade no ambiente. Há outros recursos simples e eficientes para isso, como brises ou bandejas de luz - espécie de brise horizontal fixado no caixilho que se prolonga para o interior dos espaços, direcionando a luz para os pontos mais afastados das janelas.

Um erro comum é considerar apenas o sistema de ar condicionado para o conforto térmico no interior das edificações, opção responsável por grandes demandas de energia elétrica, e que ainda tem o inconveniente de não promover a renovação do ar, condição prejudicial à saúde humana. Segundo Roberta, depende do arquiteto buscar caminhos que eliminem ou pelo menos reduzam a necessidade de usar recursos artificiais para o condicionamento do ar. “A ventilação cruzada é a solução natural e eficiente”, diz ela. Para isso, é necessário prever aberturas em paredes opostas ou justapostas, ou mesmo no teto, forçando o fluxo de ar.

O dimensionamento da ventilação deve considerar o volume do ambiente, a quantidade de pessoas e a existência de equipamentos que geram calor, como computadores e lâmpadas. Ainda com referência às fachadas, as arquitetas alertam para a necessidade de grande cuidado na especificação do produto. “O vidro errado pode transformar o prédio em uma caixa concentradora de calor”, avisa Joana.

A legislação interfere diretamente na sustentabilidade da arquitetura. Segundo Roberta e Joana, não há no Brasil a regulamentação do desempenho que deve ter determinada edificação. “Se houvesse limite de consumo de água ou de energia por tipologia, teríamos projetos mais bem resolvidos”, acredita Joana. “Não temos sequer uma lei que preveja o K - coeficiente de transmissão global, fator que indica quanto calor por metro quadrado uma parede opaca pode deixar passar”, complementa Roberta.

A questão também é apontada por Daniela. “Na Holanda e no Reino Unido já funciona um código de obras que exige o estudo de viabilidade ambiental de uma edificação, o qual, por sua vez, determina quanta energia ela poderá demandar. Além disso, a legislação no Brasil permite falhas como lotes muito reduzidos, o que implica menores recuos, maiores áreas impermeabilizadas, grandes adensamentos ou edificações que barram a passagem do vento, entre muitas outras situações”, critica. Apesar da pouca ajuda encontrada nos códigos de obras, o arquiteto que deseja projetar e construir dentro dos princípios da arquitetura sustentável pode buscar parâmetros nas normas ISO 14000 ou na Agenda Hábitat, documentos que fornecem diretrizes para o desenvolvimento sustentável, explica Daniela.

Atualmente existem diversos produtos e materiais desenvolvidos de modo a preservar recursos naturais. Os já conhecidos sensores de presença, que apagam as luzes na ausência de pessoas, torneiras com fechamento automático, lâmpadas e reatores de baixo consumo são alguns deles.

Entre as novidades estão as surgidas em decorrência das novas metas estabelecidas pelo governo federal a partir do PBPQ-H-Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Hábitat, que, desde o início de 2003, limita a 6 litros o consumo de água por descargas em bacias sanitárias. Além da redução obrigatória, algumas empresas já se adiantaram e passaram a oferecer sistemas de descarga com dois tipos de acionamento: um para dejetos líquidos, que consome apenas três litros, e outro para dejetos sólidos, que utiliza o limite de seis litros. Há também uma nova válvula de descarga com fechamento automático que impede fluxos superiores a 6 litros, mesmo que o usuário fique pressionando o botão.

Há também empresas que fornecem sistemas construtivos com madeira proveniente do manejo de baixo impacto ambiental. Eles são compostos por peças de madeiras nobres, conectadas por elementos metálicos e que admitem qualquer tipo de fechamento e acabamento.

A construção civil também pode contar com painéis estruturais do tipo OSB, feitos com tiras de madeira cruzadas, que podem ser usados para os mais diversos fins, exceto a confecção de fôrmas para concreto. Eles foram desenvolvidos para travar estruturas com perfis de madeira ou de aço e são produzidos exclusivamente com pinus de reflorestamento. Admitem acabamento com verniz, lâminas de outras madeiras, laminado melamínico e até mesmo cerâmicas, desde que fixadas com argamassa colante (cimentcola).

Além dos materiais tradicionais, há uma alternativa para a utilização de plásticos. A novidade, chamada madeira sintética, foi desenvolvida como sistema estrutural para casas populares ou cabines, por exemplo. O plástico é moído e moldado na forma de tijolos, que posteriormente são encaixados como um brinquedo de armar. Suas paredes duplas, intercaladas por um colchão de ar, ajudam a controlar o aquecimento do interior. A cobertura é feita com embalagens do tipo tetrapack.

Texto resumido a partir de reportagem de Nanci Corbioli
Publicada originalmente em PROJETODESIGN Edição 277 Março 2003.
www.arcoweb.com.br

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