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segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Águas da prosperidade






Arrudas 2011

O texto abaixo é de 1997. Por que todo verão as notícias são as mesmas? É óbvio que as soluções nunca resolverão o problema das enchentes. Só esse ano, a Prefeitura de Belo Horizonte gastará quase 60 milhões de Reais para recuperar áreas afetadas pelas chuvas, que vão desde recapeamento de vias até habitação. Ciente de que todo ano chove e que pode haver enchentes, esses milhões de Reais são um completo desperdício.

Se continuarmos impermeabilizando o solo - com asfalto, cimento e telhado - as enchentes serão cada vez mais frequentes e piores.

E bons exemplos temos. Mas continuamos na contramão. E é bem provável que no final desse ano o assunto será o mesmo. 

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ÁGUAS DA PROSPERIDADE[1]


As águas da chuva não são recursos naturais, enquanto não pensemos que podem ser. Enquanto isto, provocam catástrofes anunciadas, colhendo de surpresa a humanidade. Há muitas maneiras de aproveitar águas de chuva, obtendo quem o faz economia para si, de 1 real por metro cúbico (1.000 litros). Importante é notar que esta é economia de acesso democrático porque o cidadão que tem um teto já fez o investimento principal, que é o telhado, seu perfeito coletor. O complemento do investimento consiste em colocar calhas e recolher a água numa caixa, de 2.000 litros por cem metros quadrados de telhado, tampada como qualquer outra. Essa água é quase potável, e melhor que a de muitas cidades. Pode ser usada em sanitários, jardins, hortas, lavagem de roupas, carros, calçadas, para dar exemplos comuns.

Galpões, garagens, postos de gasolina, serralherias, escolas, universidades, com telhados de grande área, têm muitos usos possíveis para as águas de chuva, alcançando expressivas economias (um galpão de 10.000 metros quadrados, de siderúrgica ou supermercado, coletando dois terços da chuva de outubro a março, economiza 1.500 reais por mês).

De outro ângulo, quem usa água de chuva  ajuda a controlar enchentes,  erosão, assoreamento; a evitar a morte gradual dos rios; a diminuir o consumo de produtos de tratamento e de energia de adução; a reduzir o número de desabrigados; a reduzir outros estragos (os últimos levarão tempo para serem corrigidos e pararem de dar prejuízos). Já escrevi que se forem implantados coletores em telhados, que representem 1% da área de Belo Horizonte, a economia anual alcançada será da ordem de 3,35 milhões de reais. A indireta, podem crer, é muito maior, porque, além do benefício ambiental e econômico, a efetiva educação daí resultante vai fazer o povo abrir os olhos para outros grandes desperdícios que estão por aí, condenando o país a não alcançar prosperidade alguma. Isto justifica que  governos  pratiquem a renúncia fiscal em instrumentos de gestão que estimulem a coleta de águas pluviais, sem desembolso direto, contrariamente ao caso dos piscinões de São Paulo, que tipificam solução onerosa, irreprodutível, deseducativa e com objetivo limitado ao combate às enchentes. Águas de chuva aproveitadas são as águas da prosperidade; em caso contrário são as do luto e da pobreza.

O manejo das águas de chuva compreende outras vias de grande repercussão ambiental e econômica, mas não as querem e ficam nesse nhenhenhém que não vai resultar, porque segue a linha de sempre, que produziu os resultados conhecidos. Dir-se-á que a proposta não elimina enchentes, e é verdade, mas contribui e é fato evidente que retirar meio metro no nível do rio que transborda faz a diferença entre perturbação tolerável e  catástrofe.

Para terminar: entidade internacional concede certificado de qualidade a empresas que zelam pelo meio ambiente. Entre contempladas com o diploma estão muitas que, com imensos telhados não aproveitados, contribuem para o maior dano ambiental imposto às áreas urbanizadas (por aí se vendo que não temos muitos de quem copiar).

BELO HORIZONTE, 18/04/97

EDÉZIO TEIXEIRA DE CARVALHO 


[1] Estado de Minas - Opinião , 22/04/97

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